Olívia Rodrigo, Zs, cringe e planejamento de comunicação: o que tudo isso tem a ver?

Por Luan Pires, para Coletiva.net

Se você é humano, existe grande probabilidade de estar familiarizado minimamente com algum dos termos deste título.

Um resumo: Olivia Rodrigo tem 18 anos, protagonizou uma série da Disney, teve uma música viralizada no Tiktok e, assim que lançou seu álbum de estreia em meio a fofocas amorosas, conquistou o topo das paradas musicais e recordes que dariam inveja aos grandes. Ao mesmo tempo, o termo Cringe ganhou notoriedade após posts listando o que os Zs (nascidos entre cerca de 1995 e 2010) acham brega (cringe para eles) da geração anterior, os millenials ou Ys. Esses trintões dos quais faço parte tomaram um susto ao perceber que tomar café, falar sobre boletos e usar calça skinny é coisa do ado. 

Mas, o que tudo isso tem a ver? 

Muito - principalmente - para a área de planejamento em Comunicação. Em um único parágrafo falamos de análise de tendências e comportamentos, mapeamento de público e o meu favorito: estudos geracionais. Afinal, gerações são cíclicas e geralmente respondem umas às outras em comportamento. Ainda, conforme crescem viram alvo do mercado (tanto para venda quanto para novos talentos em empresas) e comprovam, quando adquirem atenção do capitalismo, que tendências e planejamento não existem apenas para colocar numa apresentação. Elas são úteis.

Em 2019, escrevi esse artigo sobre a geração Z e como as empresas ainda estavam confusas no modo de tratá-la. O interessante disso é que, ao ouvir o álbum SOUR, de Olívia, quem estudou minimamente os Zs consegue ver (ou ouvir, no caso) facilmente por qual motivo ela foi um fenômeno entre os adolescentes. Olívia e suas letras amarguradas (daí o nome do álbum) são quase uma história em quadrinhos do que as tendências mapeavam sobre os Zs anos atrás.

No artigo de 2019, eu dizia que os Zs viam o mundo como uma "grande colcha de retalhos, composta por uma diversidade abraçada de maneira orgânica". Na última faixa do álbum da jovem, há uma música chamada 'Espero que você esteja ok'. Foi escrita pensada nas histórias de preconceito que ela ouviu sem sequer conhecer essas pessoas. Olívia canta comovente: "Os pais dele se importavam mais com a Bíblia do que em serem bons com o próprio filho" ou "os pais dela odiavam quem ela amava". Um acolhimento maduro, orgânico e necessário para todas as gerações, né?

Além disso, enquanto os ingênuos Ys cresceram ouvindo que a felicidade estava ali ao final do arco-íris e se pressionaram a tornarem-se pessoas melhores, saudáveis, justas e [aqui você pode acrescentar todo tipo de característica encontrada num protagonista de uma animação da Disney], os Zs cresceram pragmáticos e foram condicionados a adotarem metas mais honestas e modestas sobre suas vidas. Também assumiram todos os vícios que nós, os Ys, só verbalizávamos em terapia (sim, eu faço terapia - joga no Google e olha o meme aí) confidenciando com a coragem que não tivemos seus sentimentos mais mesquinhos sem a mínima pretensão de alcançar a perfeição. Nas músicas da Olívia, os exemplos são muitos. 

Em Jealousy, jealousy (uma das minhas favoritas) ela escancara: "Tudo que eu vejo são garotas muito boas para serem de verdade, com dentes perfeitamente brancos e corpos perfeitos. Queria não me importar". Ou, ainda: "Você está vivendo a vida, tem um rosto bonito, um namorado bonito também. Eu quero tanto ser você, e eu sequer te conheço". Por serem hiper conectados, ao contrário dos iludidos Ys, os Zs - como mapeado em vários estudos de tendências - cresceram mais conscientes da ilusão das redes sociais e se agruparam em comunidades justamente para lidar com isso. Um Fandom, por exemplo, nada mais é do que uma comunidade de acolhimento que ocasionalmente ama o mesmo artista.

A capa do álbum da garota é uma aula de semiótica: stickers coloridos cobrindo um rosto lindamente irritado. E esse é o tom geral das músicas. No amor, por exemplo, ao contrário de outras gerações que cresceram achando que só existe um para toda vida, os Zs sabem que você pode conhecer vários durante sua história e no final acabar descobrindo que muitos deles são uns "completos babacas". O pragmatismo grita em trechos em que ela diz: "Espero que você esteja feliz, mas não como você era comigo" em Happier; ou "E não é engraçado como você correu para ela no segundo em que terminamos?" em Traitor. Sim, ainda dramático - como qualquer adolescente de qualquer geração - mas, ao invés de estarem preocupados em "sair com superioridade", os Zs assumem que "choraram no chão do banheiro" ou que, no final das contas, "a outra menina é uma pessoa legal, afinal". 

Mas, a música que mais condensa o que é ser um Z é Brutal, onde Olívia começa como um vazamento de bastidor dizendo: "Vamos deixar tudo mais bagunçado" e, após isso, lança frases que qualquer Millenial teria vergonha de itir para o seu melhor amigo. "Estou tão de saco cheio dos dezessete anos. Cadê a po** do meu sonho de adolescente? Se alguém me disser mais uma vez: aproveite sua juventude, eu vou chorar".

O ponto é: a estratégia sempre foi algo complicado na Comunicação. "É muito importante", todos item, "mas dá muito trabalho, leva muito tempo". Só que não existe comunicação eficiente sem a imersão no público com uma análise de tendências bem-feita (não uma listagem de características), mas como um estudo que responda a um contexto. Quando se planeja uma comunicação, perguntas precisam ser feitas: afinal, sua comunicação concorre com o quê na vida do seu público? Você não precisa só saber quem é seu público, necessita entender como ele se tornou quem ele é no ambiente em que ele está. Não existe público sem contexto. As empresas estão tão preocupadas em vender ideias em apresentações lindamente construídas, que esqueceram que sem tudo isso um insight é apenas uma frase circulada com cores legais. Quando na verdade, os verdadeiros insights se tornam pontes entre o que você precisa falar e o contexto em que seu público vai absorver.

E, vai um último conselho: joguem fora a calça skinny se não quiserem dedos Zs apontados para sua cara. Sobre os boletos, a vida vai mostrar para esses jovens que até uma casinha no meio do nada precisa ser paga. E, claro, não vamos esquecer dos Betas, nova geração chegando aí para mostrar para os Zs que logo os antiquados serão eles. Nossa vingança, Millenials, será cumprida. 

Agora, com licença. Preciso ir para a terapia.

Luan Pires é jornalista e planejamento de Comunicação e Endomarketing.

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