Gestação e trabalho antes da maternidade
Por Tássia Jaeger, para Coletiva.net

Este foi o meu primeiro Dia das Mães. Minha filha ainda não nasceu, mas já está aqui dentro da barriga, dando umas mexidinhas discretas, como a mãe. Está me deixando bochechuda, comilona, com manchinhas no rosto, espinhas e muito cansaço. Se isso me preocupa? Nem um pouco. Pressão estética dos outros ou minha mesma, aqui não. Mas não é sobre isso que vim falar, apesar de saber que renderia outro artigo.
O motivo de eu escrever dessa vez é porque percebi, ao ar a consumir conteúdos dessa espécie, que é bem comum ler sobre maternidade e carreira, porém pouco comum ler sobre gestação e carreira. Então, resolvi que, no meu primeiro Dia das Mães, valeria a pena escrever sobre o tema. Isso porque, principalmente, tenho notado que as pessoas só nos enxergam como mães depois que a barriga está bem evidente ou quando a criança nasceu. Entretanto, sabemos bem que a maternidade começa logo no primeiro mês. Afinal, começamos a cuidar do bebê desde o momento em que sabemos que tem outro coração batendo dentro da gente.
Mas o que isso significa? Que deveríamos nos alimentar melhor, dormir mais, descansar durante o dia, fazer atividades físicas, visitar com mais frequência médicos e fazer exames, etc. Sem falar do gerenciamento dos enjoos, dores no corpo, sono, falta de ar e por aí vai. Mas a vida real não faz intervalo para que tenhamos este tempo, né, gravidinhas?
Eis que me dei conta de que estou com cinco meses de gravidez e em dívida com minha filha. Temos pendências importantes para serem resolvidas com urgência, mas não estamos conseguindo tempo para nos cuidarmos pelo excesso de tarefas diárias, sejam elas profissionais ou pessoais. Aí falo com minha filha no banho, peço desculpas, digo que a vida da mãe dela é frenética, mas que ela ainda vai se orgulhar da mãe batalhadora que tem. Digo coisas como: "Filha, mamãe trabalha o dia todo e, muitas vezes, de noite e no final de semana também, porque precisa de renda extra para se sustentar. Mas eu sou boa em gestão do tempo, filha, e eu vou dar conta de ti também. Prometo!"
E aí fico pensando: "Como faço pra dar conta quando ela nascer, se não estou dando conta com ela na barriga? Como gerir o tempo entre ser mãe, madrasta, esposa, dona de casa, funcionária, freela, empreendedora, além do tempo para prezar pela família e amizade? E o tempo pra atividade física, terapia e lazer, como acho?". O problema é estar tentando organizar tudo isso na minha cabeça e escutar como: "Tu vai ter que pisar no freio, vai ter que abrir mão de tanto trabalho", "Tu vai ter que dormir mais, ter mais tempo pra ti". Eu só concordo, porque não tenho tempo pra ficar debatendo, argumentando. Se eu abrir mão de algo, quem me deu o conselho vai pagar minhas contas que os trabalhos pagam? Se eu for dormir mais, quem me deu conselho vai levar meu cachorro pra ear, cuidar do meu enteado e da minha filha, quando nascer, organizar minha bagunça pra eu ter tempo pra mim?
De certa forma, mesmo maquiada como ajuda ou conselho, sempre volta uma cobrança pra mãe. Ou seja, em vez de "eu te ajudo", é sempre "você precisa se ajudar", mas nem sempre é tão simples como a teoria. Onde está a tal rede de apoio, a sonoridade? Discursos vazios, a gente vê aos montes. Será que sempre vamos precisar pedir ajuda mesmo? Será que não é evidente que precisamos de ajuda? A ajuda pode ser compras no supermercado, ajudar com as tarefas de casa, ear com o cachorro, levar pro médico, ajudar a arrumar o quarto do bebê, listar o enxoval, organizar o chá de fralda, etc. Em termos de trabalho, pode ser um dia livre para médicos ou coisas relacionadas ao bebê, redução de jornada ou flexibilidade de horários, chá de fralda dos colegas, etc.
Antes de ser gestante, eu já me virava em mil pra dar conta da vida. Agora, como tal, me viro em 2 mil para dar conta da minha vida e da vida que está se formando. Depois, como mãe, vou me virar em 3 mil pra dar conta de tudo que já dava e mais uma vida que vai depender de mim. Porque eu sou assim, eu abraço, eu me viro, eu dou meu melhor, eu canso, mas não reclamo. Eu sou assim? Eu e mais várias grávidas e mães que não param. Porque não querem. Porque não podem. Porque o contexto não permite. Mas que são fortes, são guerreiras, são resilientes. "Reinventar-se, sempre" é nosso lema. E que tal reinventarmos a sociedade e a visão que esta tem das gestantes e mães que trabalham? Vamos juntas?
Tássia Jaeger é CEO da W[Right] Conteúdo, coordenadora Editorial das revistas do selo Tendências (de Coletiva.net) e analista de Comunicação do BWG.