Canalhas não têm perdão

Por Gilberto Jasper, para Coletiva.net

Futebol e política sempre dividiram o público e os profissionais de imprensa. No futebol, a maioria trabalha "disfarçada" até criticando com ênfase o time de preferência para fugir à corneta. Já na política as coisas são muito diferentes. Quem frequentou ou frequenta redações sabe muito bem qual a orientação ideológico-partidária majoritária.

Sempre encarei estas paixões com naturalidade. O coração é assim mesmo, cego à razão. Ultimamente, porém, a radicação política dos veículos de comunicação beira a vergonha. Custo a acreditar na postura de colegas que jogaram no lixo o diploma, a ética, o bom senso e o compromisso de informar com isenção. Ao menos deveriam conceder espaço para o contraponto para que o público - ouvinte, leitor, telespectador ou internauta - faça o seu julgamento. Afinal, eles são a razão de viver do comunicador.

Jornalistas - e aqui não vou generalizar porque é injusto, mas vocês sabem do que/quem falo - se transformaram em cabos eleitorais, despidos do mínimo pudor, míopes sobre a sua função social. Por isso, todos os dias agradeço ter convivido com profissionais e chefes que honram as suas funções. Falo de Eugênio Bortolon, Núbia Silveira, Hélvio Schneider, Adilson Porto Alegre e Adélia Porto, entre outros.

Na ZH, eles não "baixavam" matéria alguma sem a observância de dois quesitos fundamentais: checagem rigorosa dos dados e espaço para o contraditório. Isso, às vezes, tumultuava a rotina, porque não tínhamos a comodidade do telefone celular. Ou o repórter saía à cata do entrevistado e falava com a fonte até no máximo às 18h ou a matéria ficava para o dia seguinte. Pouquíssimas figuras públicas forneciam o número do telefone (fixo) de casa. Isso, porém, nunca foi empecilho. Pelo contrário, serviu para forjar uma geração de jornalistas que tinham compromisso com a verdade, mesmo se não gostam do teor da notícia.

Hoje, da manchete ao pé da matéria - que pode ter uma página inteira - é possível flagrar a ausência de contraponto, sequer o tradicional "fulano não quis se manifestar". O texto, mesmo capenga, vira chamada de capa, destaque de rádio e TV, usurpando a verdade. Matéria sem contraponto é versão, tese, discurso de pensamento único. Tudo, menos notícia.

Havia, sim, matérias falhas, mas eram exceções que hoje desfilam impunes como regra imprensa afora. Estou confinado há 16 meses. Aprendi a selecionar conteúdos. ei da indignação e revolta à indiferença de "não dar ibope aos manipuladores". Canalhas são seres desprezíveis, mas quando difundem mentiras com um só lado são ainda mais canalhas. Afinal, isto é manipular milhões de leitores, ouvintes, telespectadores e internautas. E isso não tem perdão!

Gilberto Jasper é jornalista.

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