"Estude enquanto eles dormem, trabalhe enquanto eles se divertem": os mitos do empreendedorismo
Por Manuella Noschang, para Coletiva.net

Você certamente já viu o texto motivacional que manda vocês lutarem, enquanto "eles descansam". Confesso que nunca me senti confortável com esses conselhos. Quando decidi empreender (pela segunda vez), eu decidi organizar minha vida profissional de forma que ela não afetasse a pessoal.
É verdade que, no início, toda empresa exige mais. Claro que um negócio próspero e independente de seu fundador, um dia necessitou totalmente de seus esforços. Até os quatro anos da Digicare, eu trabalhei sozinha. Brincava que minha equipe era "eu, eu mesma e Irene", em alusão ao filme estrelado por Jim Carrey e Renée Zellweger, no qual o ator interpreta um policial que sofre de transtorno de dupla personalidade. No entanto, quando minha agência ou a crescer e, enfim, pudemos contratar outros profissionais, eu comecei a regozijar desses frutos.
Acho justíssimo uma pessoa que dá tudo de si por um empreendimento, trabalha duro e por horas ininterruptas (na maioria dos dias, sem sequer intervalo para almoçar), ter seus momentos de lazer. Um final de semana bem curtido (repleto de diversão e descanso) é fundamental para uma nova semana produtiva e rica em criatividade, substanciais a quem atua na comunicação. Além disso, nossa área é muito desgastante e carente de reconhecimento, o que torna nosso trabalho ainda mais extenuante, demandando pausas renovadoras.
Embora trabalhe com as mídias sociais e as julgue essenciais ao sucesso dos negócios da nossa era, tenho consciência de que elas só reforçam esses pensamentos de que, para ter sucesso, não podemos nos permitir parar. As publicações dos outros, sempre tão felizes e bem-sucedidos, impulsionam os indivíduos a buscarem as mesmas conquistas, as mesmas viagens ou frequentar os mesmos restaurantes. Mas, será mesmo que para atingir objetivos é preciso abdicar de alguns instantes de gozo e entretenimento?
Felizmente, eu venci essa etapa, dando-me o direito de repousar nos finais de semana, "desligar" nas férias e respeitar minhas noites e minha família. Sim, respeito. Esse é o nome do sentimento que me mantém longe do celular quando estou com meu marido ou entre amigos. Mas, acima de tudo, eu me respeito, quando vou ao shopping ear no sábado, quando não respondo mensagens de clientes durante o jantar, quando não atendo ao celular nas férias. E, querem saber? É bom demais, é libertador. E, o melhor, minha conta bancária não fica mais negativa por causa disso!
A Digicare segue crescendo. Aliás, em seis anos, ela não registrou nenhum retrocesso, nem mesmo quando deixei de atender nos finais de semana. Isso significa que é possível prosperar, se desenvolver e curtir momentos de lazer!
Ah, eu não poderia terminar este texto sem fazer uma ressalva quanto ao último desses conselhos: "viva o que eles sempre sonharam". Ou seja, depois de viver dias intensos, de trabalhar incansavelmente como um robô, eu posso me dignar a viver o sonho alheio. Aqui, se estivesse nas redes sociais, eu usaria aquele emoji com carinha de pavor. Não! Eu não quero viver o sonho de ninguém, quero realizar meus próprios desejos, que incluem saúde, equilíbrio e uma família feliz, que a muitos momentos juntos. Empreendedora, sim. Escrava do trabalho, jamais!
Manuella Noschang é diretora da Digicare Mídias Digitais.